Comments

As bacias do Tejo e do Sado partilham o mesmo contexto geológico, fornecendo matérias-primas similares, que obrigam a usar recursos laboratoriais complexos para distinguir as respectivas pastas cerâmicas. A matriz e as características petrográficas básicas são as mesmas, sendo apenas possível reuni-las em dois grandes grupos petrográficos genéricos: “Groupe Sado-aval/Tage” / “Grupo Tejo / Sado jusante”, que inclui as olarias do Tejo e, já no Sado, as da área de Setúbal e do Pinheiro; e “Groupe Sado-amont” / “Grupo Sado montante”, que abrange as olarias de Enchurrasqueira/Xarrouqueira, Abúl, Bugio e Barrosinha (MAYET, SCHMITT & SILVA, 1996).

Existem já estudos laboratoriais de composição química das pastas cerâmicas das olarias do Tejo e de algumas do Sado, bem como da sua relação pontual com centros consumidores, como é o caso das unidades de salga de pescado da Rua dos Correeiros, em Lisboa (CABRAL et alii, 1995; 1996; 2000; 2002; DIAS & PRUDÊNCIO, 2008; DIAS et alii, 2001; 2003; 2010; 2012; PRUDÊNCIO et alii., 2003, 2005, 2009; RAPOSO et alii, 2005).

Visual characteristics

As pastas destas ânforas são avermelhadas, alaranjadas ou acastanhadas, ocasionalmente com o cerne cinzento esverdeado ou castanho. Feitas com argila não-calcária pouco dura, a textura é média-grosseira, geralmente com bastantes inclusões brancas translúcidas (quartzo) e outras, menos abundantes, branco sólido (feldspato). Incluem também bastantes partículas brilhantes (mica) e pequenos nódulos ferruginosos ou negros (óxidos de ferro). As inclusões maiores podem ser roladas e arredondadas, a par de outras mais pequenas angulosas, ou podem ser relativamente subangulosas e angulosas, de vários tamanhos.

Petrology

Todas as pastas das olarias localizadas nas bacias do Tejo e do Sado apresentam inclusões de quartzo, feldspato e mica, sendo praticamente impossível a sua distinção por meios petrográficos. Em geral, as pastas do grupo Tejo / Sado jusante não apresentam as inclusões de grão mais grosseiro, pouco anguloso e arredondado que caracterizam o grupo Sado montante. A olaria da Quinta da Alegria (Sado) distingue-se destes dois grandes grupos por conter inclusões mais calibradas (MAYET, SCHMITT & SILVA, 1996, 163).

Geoquímica

No que respeita ao Tejo, a olaria do Porto dos Cacos possui já estudos laboratoriais de composição química da pasta dos diversos tipos de ânforas (CABRAL et alii, 1996; PRUDÊNCIO et alii, 2003; RAPOSO et alii, 2005; DIAS et alii, 2010; 2012), que apontam como principal “tendência geoquímica” das produções deste centro oleiro a presença de “elevadas concentrações de Co, As e U, e baixas concentrações de Fe, Zn, Sb, Rb e K” (DIAS et alii, 2012: 65). Os elevados teores de cobalto, arsénio e urânio poderão estar relacionados com a integração nas pastas cerâmicas de argilas lodosas e ricas em matéria orgânica, comuns nas bacias sedimentares estuarinas (IDEM, IBIDEM).

A análise detalhada da composição química do Porto dos Cacos permitiu diferenciar três grupos geoquímicos, um deles associado maioritariamente às formas Almagro 51c e Lusitana 3, difíceis de distinguir ao nível dos fragmentos de bordo que constituíam a amostra. A Almagro 51c distingue-se da Lusitana 3 por apresentar teores menos elevados de Terras Raras, e da Dressel 14 por valores também menos elevados de urânio (IDEM: 64).

Na Quinta do Rouxinol detectou-se “uma maior homogeneidade composicional”, ainda que seja possível uma “ligeira diferenciação” entre as formas Lusitana 9 e Almagro 51c. Nesta última regista-se uma “maior dispersão” geoquímica, a par de um menor “enriquecimento em Fe” e de maiores teores de “TR, Ta, Hf, Th e Na” (IDEM: 65).

Para o Sado, analisadas amostras das olarias do Zambujalinho, Pinheiro, Enchurrasqueira/Xarrouqueira, Vale da Cepa, Bugio e Barrosinha, foram identificados dois grandes grupos geoquímicos, a que os autores atribuíram as designações de “Sado 1” e “Sado 2” (PRUDÊNCIO et alii, 2009). O grupo Sado 1 “apresenta em geral baixos teores de Na, Co e Sb e teores elevados de outros elementos estudados, particularmente Cs, Rb, Ta, Th e K, bem como REE [Terras Raras], quando comparado com o grupo Sado 2”, o que aponta para o “uso de dois tipos de matérias-primas, um mais félsico (Sado 1) e outro mais máfico (Sado 2)” (IDEM).

Contudo, não foi possível estabelecer uma correlação entre estes grupos geoquímicos e os determinados por análise petrográfica (Tejo / Sado jusante e Sado montante), não havendo uma associação clara às diferentes olarias e às respectivas produções. Ainda assim, todas as amostras da olaria do Pinheiro (grupo petrográfico Tejo / Sado jusante) surgem integradas no grupo geoquímico Sado 1, e a esmagadora maioria das amostras do Bugio e da Barrosinha (grupo petrográfico Sado montante) integra-se no grupo geoquímico Sado 2. Os materiais das restantes olarias repartem-se pelos dois grupos geoquímicos em presença (PRUDÊNCIO et alii, 2009).

A composição mineralógica dos grupos geoquímicos Sado 1 e Sado 2, determinada por difracção de raios X (XRD), atribui ao grupo Sado 1 valores mais elevados de K, Rb e Cs, com predomínio de feldspatos alcalinos sobre as plagióclases; pelo contrário, no grupo Sado 2 predominam estas últimas (PRUDÊNCIO et alii, 2009).